Discurso de apresentação no lançamento do livro «Bespoke / Su Misura» da Editora Libria na livraria A+A em Lisboa. Autores: A. Bianco / M. Gotti; M. Curzi; A. Liverani / E. Molteni; L. Pasquini / F. Tranfa; D. Rossi; G. Santagostino / M. Margarido.

Giorgio Agamben num livro recente, ao discorrer sobre o tema de "corpos gloriosos", referiu-se à teoria de um filósofo do início do século XX, residente em Napoles, chamada "Philosophie des Kaputten" ou em português "Filosofia do Avariado":

A teoria versava, e cito aqui Agamben: "as coisas para um napolitano simplesmente só começam a funcionar quando são imprestáveis. O que quer dizer que ele só começa a usar realmente os objectos técnicos a partir do momento em que (estes) deixam de funcionar; as coisas intactas, que funcionam bem por sua conta, ofendem-no e ele vê-as com maus olhos."

O que é curioso nesta referência sobre corpos gloriosos, é a necessidade imperativa de dar o toque pessoal, de forma a personalizar e glorificar esses objectos. E cito um exemplo fascinante do texto: o de dar uma "pancada no momento oportuno, (para) consegu(ir) fazer com que os aparelhos funcionem exactamente segundo os seus desejos".

Outro exemplo, também referido por Agamben relativamente a “corpos Gloriosos”, é a importância da suspensão das actividades desses objectos para efeitos de exibição. E mais uma vez cito: "O corpo glorioso é um corpo ostensivo, cujas funções não são executadas, mas mostradas; a glória é, neste sentido, solidária da ociosidade.”.
A meu ver o acto de publicar em arquitectura, tem incidido recorrentemente nestes dois temas de Agamben, e na forma como exibimos determinados objectos-edifício eleitos, por vezes vazios e em pleno simulacro de si próprios, separados das suas operações, permanecendo, como que em suspenso e impotentes, nesse momento de ostentação e do registo per si

Por outro lado, parece existir a ulterior necessidade de encaixar uma espécie de pancada-de-lado no "aparelho", para que o conjunto destes corpos ou objectos-edifício melhor funcionem, e se alinhem lado a lado pelas páginas do livro que os corporiza, dando-lhes um sentido de nova identidade colectiva, que só por si não o teriam.

Talvez por isso sinta, que se possa verdadeiramente dizer, que reconhecemos para além da ostentação, ora inquietante, ora enigmática, dos objectos-edifício deste livro aqui retratados, também alguma glória. 

Parabéns aos autores e editor deste livro, que por acaso nenhum é napolitano, pela excelente publicação que nos trazem.»

2012/06